04 setembro, 2009

Poema do dia



(Poema publicado antes
neste blog)

BIZARRO

Às vezes a natureza pinta formas tão bizarras,
que nunca ficariam bem se fossem pintadas pela mão humana.

Qualquer lagosta ou moréia é exemplo claro disso.

Um cachorro de costas, acho que ninguém saberia como desenhá-lo.

Um gole mal dado numa cerveja quente produz uma cara inimitável.

E assim também o insondável brilho dos olhos no primeiro beijo,
o riso incontrolável, que vence os lábios,
ou o insubordinado ato falho, que escapa da prisão inconsciente...

O latejar das veias de um terrorista e o suor que escorre do seu rosto tenso,
no momento de explodir, são o resultado de processos mentais intangíveis.

O olhar atônito sobre a Hiroxima atômica
só continuará nos olhos radioativos de quem a viu.

Ninguém saberia reproduzir o embaraço
de um cãozinho vigiando o cadáver podre de seu único dono.

Ninguém poderia experimentar o nó na garganta do homem-pássaro
que despencou do céu e se esborrachou no meio da rua sem pedir licença.

3 comentários:

  1. "O olhar atônito sobre a Hiroxima atômica
    só continuará nos olhos radioativos de quem a viu."

    Cara, quando você postou este texto no blog do André, foi este fragmento que me chamou a atenção para a sua estilística e sua retórica: irretocáveis! Prazer relê-lo!

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  2. Profundo suspiro... Moço! Por vezes penso na natureza das coisas que se materializam a furo, incluindo o parto, visto que é incontrolável o poder de rejeição de um corpo, quando expulsa aquilo que ele não considera seu ... Seu texto supera minha imaginação... Introspecção subjetiva.
    “Dentro do bombom há um licor a mais...” Insisto. Que bom!

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  3. Obrigado, amigos!

    Considero que tudo nessa vida só é "tangível" parcialmente... A vida é sempre maior e mais complexa do que o maior e mais complexo dos nossos sonhos.

    A melhor das representações fica no campo da arte. Mas toda apreensão é sempre incompleta por natureza.

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Eu agradeço o comentário!